"Antes, em cada três hexágonos havia um homem. O suicídio e as enfermidades pulmonares destruíram essa proporção. Lembrança de indizível melancolia: às vezes, viajei muitas noites por corredores e escadas polidas sem encontrar um único bibliotecário."
"Não é só o sexo que importa! Para mim, outra qualidade faz um homem brilhar extraordinariamente: a cortesia. A cortesia masculina me conquista imediatamente. Apaixono-me num segundo. 'Cortesia masculina? O que você entende por isso?', talvez vocês me perguntem. Uma mistura de gentileza, de polidez perfeitamente fluida, sem ostentação ou hesitação; uma flexibilidade do gesto; um modo de se dirigir a mim enquanto mulher sem nenhum efeito de sedução artificial, mas com respeito, afinal de contas, e interesse também; uma escuta amena, jamais rude. O que tanto me encanta nessa engenhosa mistura de ingredientes? Um modo completamente etéro de um homem se apresentar a uma mulher, a criação de um ambiente acolhedor que ofereça bem-estar, e uma virilidade tão assumida que se torna evanescente, mas consistente o bastante para ser notada, uma virilidade destilada em palvras e gestos, que concentra toda a energia no autocontrole e na preocupação com o outro. Sucumbo. Entro no clima e me entrego, mais uma vez, eu plano."
"A doçura é uma virtude feminina. É por isso, talvez, que ela agrada, sobretudo, nos homens.
Poderão objetar-me que as virtudes não têm sexo, o que é verdade. Mas isso não nos dispensa de o ter, e o sexo marca todos os nossos gestos, todos os nossos sentimentos e até as nossas virtudes. A virilidade, nada obstante o que a etimologia possa sugerir, não é uma virtude, nem o princípio de nenhuma. Mas há uma maneira mais ou menos viril, ou mais ou menos feminina, de ser virtuoso. A coragem de um homem não é igual a de uma mulher, nem sua generosidade, nem seu amor. Veja-se Simone Weil ou Etty Hillesum: nenhum homem nunca escreverá, nem viverá, nem amará como elas… Apenas a verdade é absolutamente universal, logo assexuada. Mas a verdade não tem moral, nem sentimentos, nem vontade… Como poderia ser virtuosa? Só há virtude do desejo, e que desejo não é sexuado? “Há um pouco de testículo”, dizia Diderot, “no fundo de nossos raciocínios mais sublimes e de nossa ternura mais pura.” Testículo dizia-se então também para os ovários; mas isso não anula a diferença entre um e outro… Se só há valor para o desejo, como creio, e por ele, é normal que todos os nossos valores sejam sexuados. Não, claro, no sentido de que cada um deles seria reservado a um dos dois sexos, queira Deus que não, mas antes no sentido de que cada indivíduo terá, em função do que é, homem ou mulher, esta ou aquela maneira, masculina ou feminina (e o sexo biológico não basta para tanto), de vivê-los ou carecer deles… Que desastre, nota Todorov, “se todo o mundo se alinhasse aos valores masculinos”! Seria o triunfo da guerra, ainda que fosse justa, e das idéias, ainda que fossem generosas. Faltaria o essencial, que é o amor (ninguém me tirará da cabeça que o amor, tanto para o indivíduo como para a espécie, começa pela mãe), que é a vida e que é a doçura. Não me venham objetar, por piedade, que as mulheres também têm idéias: já o percebi. Mas acho que percebi também que elas com freqüência se deixam enganar menos que os homens pelas idéias, o que, é claro, depõe em favor das mulheres. Poucas mulheres, segundo creio, ter-se-iam disposto a escrever a Crítica da razão pura [de Kant] ou a grande Lógica de Hegel, por motivos que, parece-me, prendem-se ao que torna esses livros, apesar de geniais, tão pesados e aborrecidos: eles supõem uma seriedade intelectual, uma fé nas idéias, uma idolatria do conceito, que um pouco de feminilidade torna improváveis, mesmo num homem, e quase risíveis, não fossem tão mortíferas. O que há de mais pobre que uma abstração? O que há de mais morto e mais ridículo do que levá-la totalmente a sério? [...]"
Queridos leitores, se há uma coisa que vocês devem almejar nessa vida é conhecer mulheres assim: sem preconceitos, sem culpas, sem pudores, sem vergonha; corajosas, ousadas, ferinas!
AMEI o livro, mas não farei uma resenha...
Cada um tem que ver/ler com os próprios olhos!
Segue um dos muitos trechos que assinalei:
"O sujeito satisfeito
que se diz
muito feliz
me lembra muito
um idiota.
Porque só os idiotas
almejam a felicidade."
(Escritos Malditos, p. 26)
Parabéns, Andréa! De fato muito diferente de tudo o que já escreveste, mas sob o signo de Bukowski não poderia ser de outro modo! Adorei! (Eis o blog da autora: http://andreatpm.blogspot.com/)
Sempre preferi os livros aos filmes, quando estes são baseados naqueles. Não é preconceito, é gosto. Gosto de ler. Como este está na lista dos meus 10 melhores livros, não resisti. Quem tem preguiça de ler, vale a pena para tomar contato com a obra (de Oscar Wilde). Quem já o leu, terá uma outra visão do livro. Quem não quer saber de ler, nem de assistir, só está perdendo.
Além de um excelente retrato da aristocracia inglesa do século XIX, o livro é denso, permeado por diálogos profundos e certeiros.. Pensei que seria difícil adaptá-lo para as telas... claro, em alguns momentos de fato o é... Dorian é interpretado por um ator novo e pouco conhecido, mas Clin Firth faz um Lord Henry bastante sedutor e convincente.
("A obra de Gatti foi parar no metrô - do Rio de Janeiro - meio por acaso, como plano B para um projeto idealizado pelo amigo Azamor Serrão Neto. Sua ideia era veicular conteúdo cultural nos monitores das plataformas do metrô, que geralmente só exibem notícias." - Revista Piauí de julho, p. 13).
"Me deixe respirar, por longo, longo tempo, o cheiro dos seus cabelos, neles mergulhar todo o meu rosto, como um homem sedento na água de uma fonte, e agitá-los com minha mão como a um lenço cheiroso, para sacudir lembranças no ar.
Se você pudesse saber tudo que vejo! Tudo o que sinto! Tudo o que ouço em seus cabelos! Minha alma viaja por sobre o perfume como a lama dos outros homens por sobre a música.
Seus cabelos contêm todo um sonho, repleto de velas e mastros; contêm grandes mares cujas monções me levam a encantadoras regiões, onde o espaço émais azul e mais profundo, onde a atmosfera é perfumada pelas frutas, pelas folhas, e pela pele humana [...]"
(Em Pequenos Poemas em Prosa, p. 85)
quarta-feira, 6 de julho de 2011
"A felicidade aparece para aqueles que choram, para aqueles que se machucam, para aqueles que buscam e tentam sempre e para aqueles que reconhecem a importância das pessoas que passaram por suas vidas."