sexta-feira, 28 de maio de 2010

Tudo invades tu

Estava perdido nos confins da terra que tanto amava.
Levava uma vida de pequenos prazeres naquilo que entendia ser o melhor a usufruir. Se escondia num cotidiano sem esperanças. Fugia dele nos livros e nos amigos como se confiasse que um dia tudo mudaria. Convicto, pensava não ser necessário intervir nas voltas do mundo. E esperava o tempo passar nos pequenos goles da bebida quente, como se não houvesse mais o que fazer.
E entrou de mansinho no universo dela que, quando se apercebeu, estava todo tomado.
Ele era um menino grande, de ideias arrebatadoras, guardadas sob uma aparência circunspecta. Tinha um jeito ponderado de falar, um olhar calado e a expressão distante, como se nunca estivesse conectado à pequenez das coisas que são desse mundo. A inteligência o fez criar um mundo particular, onde se metia diuturnamente em divagações constantes. Esforçava-se para descer quando ela requeria atenção, mas logo tornava a subir, entretido em seus próprios pensamentos...
Ao mesmo tempo em que parecia ter uma facilidade em arrumar as malas e ganhar o mundo, havia um arraigamento que o paralisava. E os seus não estavam todos feito rebanho num mesmo lugar... estavam espalhados. Só ele teimava em ficar. A mente era livre. O coração estava preso.
Ela já havia alertado que é preciso espantar os fantasmas, colocar as imagens em ordem, cada uma em seu lugar, para ver o que realmente sobra. Ele não a compreendia. Ou ainda não lhe era possível realizar.
Os sonhos de grandes aventuras, emocionantes viagens e paixões avassaladoras existiam na abstração do pensamento que sempre lhe assombrava... mas a concretude de tudo o que possibilitaria esses arroubos estava prestes a ser anotada em algum caderno que nunca compraria.
A companhia dos mais velhos o agradava. E sempre de homens ousados, como se neles projetasse tudo o que pretendia, mas sabia não ter coragem de inscrever em sua própria história. Era como se aprendesse para guardar, pois até a descendência do seu nome nunca cogitara seriamente. E com eles criava laços indissolúveis, como se fora o protagonista da história do outro e responsável pelo rumo que tomaria.
E sempre que ela percebia que o medo lhe tomava o espírito, suplantava tudo o que lhe era mais caro para ir em sua direção. Era então que se davam as conversas mais profundas, brotavam com facilidade as palavras mais significativas, como que numa delicada carícia no homem que existia apesar dela.

Tudo é possível quando há a entrega, o encantamento, a confiança, o desejo, a cumplicidade, o respeito, a admiração, o carinho, a delicadeza, o apaixonamento... necessários.

L. Fontes

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