quarta-feira, 22 de setembro de 2010

7 Pecados

Recordo-me bem que dos livros da coleção Plenos Pecados os que mais gostei foram, indubitavelmente: Inveja - O mal secreto e Luxúria - A casa dos budas ditosos, escritos, respectivamente, por Zuenir Ventura e João Ubaldo Ribeiro.
E é deste que quero falar.
Como diria Marilena Chauí:
"Dos sete pecados capitais, a Luxúria é o mais terrível, porque é o mais sedutor e porque dela nascem os outros seis ou por ela são eles estimulados." (em Repressão sexual: essa nossa (des)conhecida).
Concordo em gênero, número e grau! Preguiça, gula, inveja, ira, avareza ou soberba combinados com a luxúria podem proporcionar deliciosas sensações poucas vezes experimentadas ou sentimentos de extrema complexidade. E cada uma das combinações, por si só, renderia boas postagens.
O desejo carnal satisfeito seguido de uma bela sessão de preguiça...
Gula por deliciosidades desfrutadas na cama...
Inveja do desregramento alheio...
Isso pra não falar nas acaloradas discussões que renderiam a análise sobre a liberdade de corpo, mente e espírito que os protagonistas têm que ter para se lançar em determinadas aventuras do gênero, ocupando-se apenas do desejo da carne.
Sim, a culpa é o oitavo pecado capital!
Bem, o fato é que João Ubaldo se arriscou não pela escolha da temática, mas por optar por escrever como se fora mulher. Sob esse ângulo o livro foi alvo de muitas críticas, algumas delas bastante pertinentes.
A mim me parece que na produção literária em que mulheres são autoras há uma liber(t)ação do corpo, que aparece desligado das amarras psicológicas, sociais ou culturais que o aprisionam. Fala-se do prazer e a mulher deixa de ocupar o lugar do silêncio, da ausência, passando a ser sujeito dos textos através da fala, do discurso, da escrita. Embora trate de valorizar o corpo feminino, imprime na escrita um mundo de experiências próprias, nem sempre aceitas pelo sistema patriarcal.
(E aqui não estou tomando como exemplo o "A vida sexual de Catherine Millet" que até quem se considera ultra-super-hiper-giga-mega-master liberal quando o assunto é sexo, considera as experiências, relatadas pela autora como autobiográficas, inverossímeis)
Então como um homem poderia falar do desejo de uma mulher ou vice-versa?
Isso não parece possível sequer sem a troca de gênero!
Alguns temas, particularmente, exigem conhecimento empírico para serem abordados, sob pena de o gênero (e 'otras cositas más') revelar-se na escrita.
Recentemente fui desafiada a fazer o mesmo, ao avesso. Não consegui; me revelei a cada linha. Há muito de mim no que escrevo. Há muito do meu corpo, do meu prazer, da minha experiência como fêmea. Há muito de mulher.
As opiniões foram as mais variadas: de que era um homem escrevendo para agradar a uma mulher; de que eu sou muito fêmea, com os hormônios saindo por todos os poros e isso transparece no texto; que quem me conhecia bem sabia o quanto de mim havia naquela crônica.
Valeu, porque me diverti!
Constatei que uma mulher definitivamente não sabe como fala o falo. 
Mas, enfim... ainda assim o livro é delicioso e queria ter assistido à interpretação da personagem pela Fernanda Torres no teatro e em Sampa, 'of course'. Pena que geralmente falte companhia, às vezes grana e eventualmente tempo.
Por fim, para que cada um tire suas próprias conclusões, segue um trecho em que a protagonista do livro relata a fantasia que nutria para o momento de seu desvirginamento:
"E então chega o momento tão ansiado. Sem pronunciar uma palavra, ele fecha a boca da donzela com um beijo decidido entre seus bigodes másculos, insinua seus quadris, delicada mas firmemente, entre as coxas dela e dirige a glande inturgescente para o hímen, então trêmulo e lubrificado pelos fluidos naturais da vagina. Resoluto, ele se assegura, às vezes com a ajuda das mãos, de que está no ponto certo e então, enquanto ela dá um gemido abafado, entre a dor e o prazer da fêmea que finalmente cumpre seu destino biológico, penetra-a com um só impulso vigoroso, abre-lhe mais as pernas, inicia um movimento de vai-e-vem profundo e, finalmente, derrama-lhe nas entranhas o morno líquido vital, sem o qual ele não é nada, ela não é nada." (p. 58)
(Atentem aos adjetivos e advérbios utilizados para descrever o macho e a fêmea!)

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