quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Crônica de uma paixão avassaladora

Viajamos juntos pela primeira vez. Espanha era o destino. Barcelona era a parada.
Nos instalamos no hotel. Ela largou as malas, tirou os sapatos, as meias, as calças, deixando um rastro impensado em direção à sacada. Debruçou-se na grade para melhor admirar a bela vista para as Ramblas. Feliz, respirou fundo como quem se dá conta de que enfim não desejava mais nada, apenas estar ali. Era difícil vê-la assim. Gostava dessa inconstância, mas ao mesmo tempo algo me incomodava. Foda-se. Logo percebi que já a olhava me questionando por quanto tempo mais conseguiria ficar longe daquelas coxas.
Fui em sua direção, peguei-a pelo rosto e beijei-lhe a boca com tesão. Sempre que isso acontecia, ela ficava na ponta dos pés, me enlaçava, já se esfregando, e me presenteava com um gemido gostoso de mulher safada. Passei os dedos por dentro da calcinha só pra constatar o que já sabia e os lambi vagarosamente fixado nos olhos dela.
Fui afastado com aquele olhar de ingenuidade que ela faz tão bem, dizendo estar com fome. Escolhemos rapidamente algo no cardápio e depois nos deitamos pra descansar.
Já era tarde quando decidimos sair. A diferença de fuso faz com que no início tudo fique um pouco desordenado.
Deixei-a ocupar o banheiro à vontade, tomar um banho demorado, enquanto abria um vinho. Gosto de perceber os pequenos detalhes do ritual feminino. É rico. E não há nada melhor que observar um corpo nu de mulher andando languidamente pelo ambiente, apenas concentrada em se arrumar.
Procura o creme. Coloca um dos pés sobre a cama. Gosta dos pés. Eu também. Razão pela qual naquele instante pensei em ter aqueles dedinhos na boca, lamber o dorso e mordiscar o calcanhar. Ela sabe ter um cheiro que é só dela e um gosto particularmente doce, mas se lambusa com cremes que dão um frescor de fruta recém colhida que me deixa os instintos em estado de alerta. Quis devorá-la naquele instante.
Colocou a calcinha, o jeans justo, uma blusa fresca, o salto e só. Prendeu o cabelo no alto, deixando a nuca aparente, como sabe que gosto, grandes brincos e uma corrente, que me pede para fechar. Nesse instante, me descontrolo. Largo a taça de vinho e avanço na direção dela. Quase provoco o total desalinho, no que sou peremptoriamente barrado.
Conformado em apenas apreciar as omoplatas, dei de ombros com um sorriso e um tapa na bunda, deixando-a pintar os lábios enquanto tratava de me arrumar rapidamente.
Pronto, vi que naquele momento era eu o observado. Perguntei o que tanto ela olhava. De bruços na cama, pés para o alto, vinho na mão, abriu um sorriso largo e respondeu:
- Nada em especial. Gosto do todo.
Adorava aquele sorriso. Iluminava o ambiente. Me iluminava o pensamento. Enchia o mundo de grandes expectativas.
No elevador, idéias avassaladoras me passavam pela cabeça. Pressentindo, ela chega perto, me envolve pela cintura colocando a cabeça no meu peito, e já tenho vontade de guardá-la como se fora um ‘biscuit’ de coleção.
Ela guia a dança. Eu permito.
Saímos caminhando em meio à noite escura. Pretendíamos encontrar alguma casa de dança flamenca. Nada para turista ver. Algum lugar conhecido apenas pelos nativos. Melhor: uma taberna com algum casal dançando flamenco para que pudéssemos trocar fluídos desfrutando do clima.
Pedimos informações.
Caminhando pelo Barrio Gotico, finalmente encontramos um lugar adequado. O cheiro de cigarro misturado à umidade das paredes do lugar era forte. O ambiente emergido numa penumbra, levemente iluminado pelas velas acesas em apenas algumas das mesas.
Escolhemos uma mesa de canto, bem em frente ao casal que dançava. Levantei para pegar a bebida. Bom pretexto para observá-la de longe. Foi então que a vi acendendo vagarosamente o cigarro, dando a primeira tragada, soltando a fumaça, absorta. Deslizava a mão pelo pescoço como se estivesse se acariciando. Olhava o casal, mas o pensamento fugidio já planejava alguma coisa. Então procurou meu olhar. Sorriu e me chamou com uma expressão de reclamo.
A música era forte e quente e a dança inspiradora.
Já comentávamos a sintonia do casal, falávamos de nós e em muita putaria.
A bebida proporcionava a facilidade dos beijos cada vez mais intensos.
Tentando fugir do inevitável, levantou-se dizendo que iria ao banheiro. Levantei também, afastei a cadeira para que ela passasse. Esperei alguns minutos e fui atrás.
A pia com um espelho ficavam do lado de fora do banheiro. Quando ela saiu, me perguntou o que fazia ali e eu disse que também iria ao banheiro.
No momento em que ela se inclinou para lavar as mãos, peguei-a por trás.
Levou um susto, mas no instante seguinte deslizava os dedos molhados pelo meu pescoço e a minha boca. Nos olhávamos pelo espelho. Então segurei-a pelo rosto e disse:
- Não faz barulho.
[...]

Não fiquem tristes, achei prudente parar por aqui!

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